segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Tarantino Livre

Quentin Tarantino é um cineasta que conseguiu imprimir sua assinatura em Hollywood nos anos 1990 com filmes onde a violência gratuita é um personagem a parte, mas nunca deixando de lado um fator importantíssimo para qualquer história: o roteiro e seus personagens. Tarantino sabe como poucos contar uma boa história e domina magistralmente a arte do diálogo, por um motivo único apenas: ele ama seus personagens como se fossem seus filhos e sabe exatamente como cada um deles deve falar e se comportar em cena. Filmes como "Cães de Aluguel" e "Um drink no inferno" foram apenas prelúdios de uma carreira em constante ascensão, que já brindou os fãs da sétima arte com pérolas como "Pulp Fiction" e "Bastardos Inglórios". Em "Django Livre", seu mais novo trabalho, Tarantino, presta clara homenagem aos clássicos diretores  John Ford e Sergio Leone, entre outros, que moldaram seu gosto pela sétima arte e o ajudaram a criar esse seu universo particular.

"Django" é uma ópera sangrenta em 5 atos ambientada numa faroeste pré Guerra Civil, onde o diretor brinca de mocinho e bandido, colocando o dedo na ferida nunca cicatrizada definitivamente no âmago da sociedade americana: o  preconceito contra os negros a partir da cultura escravocrata. É interessante, portanto,  ver logo no primeiro ato que o único personagem que enxerga a real crueldade e barbárie do escravagismo é um alemão, Dr. King Schultz (Chistoph Waltz, impecável mais uma vez), um ex-dentista que vaga de cidade em cidade no gutural velho oeste caçando fugitivos da lei, a busca de recompensa. Ao recrutar Django (Jamie Foxx, no automático) para ajuda-lo numa missão e prometer, como recompensa, não só liberta-lo, como ajuda-lo a libertar sua amada Broomhilda (Kerry Washington), uma escrava que fala alemão, das garras do insano Calvin Candie (Leonardo di Caprio, soberbo em cena), um fazendeiro cuja maior diversão é promover as lutas "mandingo", uma espécie de luta entre gladiadores negros do século XIX, Schultz mostra a platéia que as vezes é preciso olharmos de fora para entendermos como uma sociedade funciona - e como podre ela pode ser. Maior exemplo disso é o personagem de Samuel L. Jackson, Stephen, o escravo mordomo de Calvin Candie, que defende seu amo com todas as forças e odeia qualquer negro mais que a morte.

Mas esse é um filme de Tarantino, e ele não está aqui para fazer apologia a isso ou aquilo, não diretamente; ele quer entreter. E de entretenimento ele entende, banhado a sangue e violência. O massacre no final do quarto ato é regido com tanta maestria que a platéia entra em êxtase ao ver litros e mais litros de sangue serem jogados nas paredes do cenário, mas nunca chocando, pois o humor (negro) está sempre presente, anuviando a tensão e preparando a platéia para um quinto ato viceral com Django completando sua vendeta contra seus algozes no melhor estilo hollywoodiano dos anos 1980.

Não, esse não é o melhor filme de Tarantino. Há cenas dispensáveis, como a discussão entre os cavaleiros mascarados (precursores da Klu Klux Klan?) sobre como as máscaras costuradas pela mulher de um deles dificulta sua visão, ou seja, uma cena digna do melhor de "Porta dos Fundos", que fazem a graça do momento da Internet, mas que nada acrescenta à história. Sabe-se lá porquê Tarantino a deixou no corte final. Mas mesmo assim é um autêntico Tarantino e certamente, fã ou não, você irá se divertir muito assistindo-o.

"Django" está concorrendo nas seguintes categorias no Oscar 2013:
  • filme;
  • roteiro original.;
  • ator coadjuvante (Christoph Waltz);
  • fotografia;
  • edição de som;


Um comentário:

  1. A verdade é que o Tarantino não tem mais muita coisa a que provar. Ele construiu sua carreira baseada na construção dos personagens, humor negro e "exaltação" da violência. E esses 3 quesitos estão presentes em todos os seus filmes. Acho que só Jackie Brown foge desse padrão, por ser o filme menos violento dele (e nele, ele provou que não precisa da violência para construir um bom filme).

    Como vc disse, considero Pulp Fiction e Bastardos Inglórios as duas maiores pérolas dele. Django Livre é muito bom, mas não supera esses dois.

    ResponderExcluir