quinta-feira, 30 de junho de 2011

Um (des)governador e seu mea culpa

“Cada povo tem o governante que merece”, diz a sabedoria popular. Mas será mesmo? Dói ter que admitir que o povo do meu Rio de Janeiro, tanto da cidade, quanto do estado – aliás, um dos mais ricos da União – merece ter como governante um homem que não aparenta ter nenhum escrúpulo, nem um pingo de dignidade, alguém que, como bom político brasileiro que é, só governa em favor de uma única causa: a sua.

Recentemente os meios de comunicação revelaram o envolvimento pessoal de Cabral com vários empresários cujas empresas têm contratos de prestação de serviços com o estado e até mesmo isenção milionária de impostos, como se o Rio de Janeiro,  mesmo sendo rico como bradei no parágrafo anterior, não precisasse. Não bastasse isso, há ainda o conhecido fato de sua mulher ser sócia do escritório de advocacia que tem como cliente ninguém menos do que a Supervia, (ir)responsável pela linha ferroviária do estado, e o Metrô Rio, que dispensa quaisquer apresentações. Para Cabral, isso não significa nada. Absolutamente nada. Afinal, ele, antes de ser pessoa pública, político e governador, é um ser-humano (?!) e tem direito a sua vida pessoal, podendo tecer laços de amizade com quem quer que seja, não? Bem, na verdade, não, ele não pode. Digo, ele pode, claro, ser amigo de quem quiser, e nem vou entrar no mérito da idoneidade de quem quer que seja de seu círculo de amizade; não tenho conhecimento para tanto. O que de fato não pode é confundir amizade com política. Misturar os dois é quase fatal! Ele querer pegar o jatinho de seu amigo (?) Eike Baptista para ir para a Bahia a passeio não teria qualquer problema não fosse Eike dono de um Grupo Empresarial que tem vários contratos com o Estado. Ou mesmo hospedar-se na casa de Fernando Cavendish não seria um problema, não fosse ele dono da Delta, uma das maiores empreiteiras do país e que detém a maior porcentagem dos contratos de obras e outros serviços no estado do Rio de Janeiro (cerca de 83%; veja o infográfico abaixo), e muitos deles inclusive sem licitação, devido ao “caráter emergencial da obra”, conforme denúncia do deputado Luis Paulo Corrêa (PSDB).

Infográfico copiado do jornal O Globo.

Infelizmente foi preciso uma tragédia de nível pessoal para que Cabral “acordasse”, descesse de seu pedestal e fizesse um mea culpa, chegando inclusive a sugerir que fosse criado no um código de conduta que estabeleça limites para relação do Executivo com empresários. Ok, ok. Muito bonito, Sr. Governador. Seria o ideal não fosse um pequeno detalhe: esse código de conduta já existe! Além do decreto federal 4.081 de 2002, assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, que institui um código de ética para o presidente e para o vice-presidente da República, textos como a lei 8.429, de 1992, que define o que pode ser enquadrado como improbidade administrativa, e o próprio estatuto dos servidores do estado listam o que se deve esperar de um funcionário público no exercício da função. Ora, será que o senhor não leu ao menos o estatuto dos servidores estaduais?! Pelo visto, não.

Eu gostaria de saber se tudo isso está chegando aos olhos e ouvidos do eleitorado de Cabral, que infelizmente não se limita ao chamado “povão”, que para os políticos deve sempre continuar o mais ignorante possível, mas também setores da classe média e até classe A – que deveriam ser mais esclarecidos. Cabral foi reeleito claramente por conta de uma única ação que dera certo em seu primeiro mandato: a criação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora). Reconheço que o programa é interessante e trouxe algum resultado, embora não seja a única coisa que deva ser feita, como aparentemente parece estar sendo, para a segurança pública do estado. Mas não deveria ser o único ou principal motivo para que o governador pudesse ser reeleito. O estado está ai, afundado em desgraças naturais ou não, e os responsáveis são todos ligados ao Governador, com suas secretarias mal estruturadas ou mesmo largadas nas mãos de incompetentes que parecem ter o rabo preso com empresários inescrupulosos que só visam o lucro exorbitante e, assim como aqueles que financiam, estão pouco se lixando para o bem estar da população.

Mas a população tem UPPs! A população tem UPAs! A população tem o Maracanã.. Opa, não, não tem mais. Ainda. Um bilhãozinho de reais e alguns anos depois, o Maraca volta pro povão, que esquecerá rápido esses atos, digamos, menos dignos de seu governante e não poupará votos para elegê-lo novamente ou a quem ele apoiar.  É, o povo do Rio de Janeiro realmente merece o governo que tem. Não deveria, mas é essa a verdade.

Quer fazer um mea culpa de verdade, Cabral? Renuncie.

2 comentários:

  1. Daniel Durvault Roitberg1 de julho de 2011 às 11:41

    Sérgio Cabral é uma representação coerente da realidade brasileira. A figura dele é mérito da sociedade que o elegeu. Dentro do sistema eleitoral de escolha de representantes, os eleitos só tem demonstrado honestidade no que tange a própria desonestidade.

    Ora, temos um legislativo que aumenta o próprio salário porque considera indigno o que recebem agora, pois "são figuras políticas que precisam apadrinhar crianças, comprar presentes, comparecer em festas populares que o homenageiam e outros eventos igualmente caros!". Em outra oportunidade, deputados, indignados com a expedição de um decreto executivo federal, ameaçam parar de votar projetos do governo de Dilma, como se isso fosse prejudicar somente a figura política da presidente e não o eleitorado... Depois disso, a presidente cede a pressão e adia a expedição do referido decreto.

    Todos agem como se isso fosse normal. Defendem posições com base nesses argumentos como se fosse direito de um parlamentar ameaçar não exercer sua função se outro agente político agir como ele não concorda, ignorando os instrumentos políticos e constitucionais existentes para essas ocasiões... Mas para usá-los, ora bolas, aí você não pode ter o rabo preso!...

    E o povo do Rio de Janeiro? A elite? Bem... Os bombeiros lutam pelos próprios salários, os maconheiros pela própria droga, os religiosos pela própria igreja... O interesse de quem sai de casa para protestar tem que ser muito atuante em sua realidade. Ninguém fala se não for do próprio interesse falar. Ninguém vota em quem não vai agir estritamente a favor do que precisa no seu dia a dia.

    Fora essas questões "práticas", você tem que lembrar que a maioria dos eleitores acha que é função do "deputado" arrumar emprego pra ele e para os parentes. Que é função do "deputado" comparecer nas tais festinhas populares e levar presente. Que um bom deputado é aquele que roubar, mas faz.
    Mas isso é o povão!... Classe média sabe das coisas, né? :P

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